Planejamento para o Futuro: Autocuratela e Testamento Vital em Foco

Instrumentos legais como a autocuratela e o testamento vital oferecem proteção e dignidade na gestão de saúde e patrimônio em situações de incapacidade.

06/12/2025 às 16:01
Por: Redação

Pessoas com idade igual ou superior a 18 anos podem utilizar diversos instrumentos de planejamento pessoal e patrimonial para assegurar seus direitos durante a vida e após a morte. Documentos como as escrituras de autocuratela, as escrituras declaratórias de manifestação de vontade, conhecidas como testamento vital, e o planejamento sucessório tornam-se aliados fundamentais, especialmente para aqueles com doenças graves ou idosos, garantindo proteção contra a gestão indesejada de suas questões de saúde e de seus bens.

 

A escritura de autocuratela, conforme explica Rose Melo Vencelau Meireles, professora e procuradora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e presidente da Comissão de Órfãos e Sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RJ), é um documento público formalizado em cartório de notas. Por meio dele, um indivíduo plenamente capaz estabelece quem será seu curador em caso de futura incapacidade, delegando a essa pessoa a responsabilidade pelas decisões de saúde e patrimoniais em seu nome.

 

A Importância da Autocuratela e Prevenção de Conflitos

Com a autocuratela, o juiz responsável nomeará o curador previamente indicado pelo indivíduo. A ausência desse documento, no entanto, implica na nomeação do curador pelo juiz seguindo uma ordem legal, que frequentemente não reflete a vontade do curatelado e pode gerar conflitos entre familiares sobre quem assumirá essa função. Para Rose, a maior vantagem reside na tranquilidade de saber que, em eventual incapacidade, as decisões serão tomadas por alguém de total confiança, resguardando os interesses do indivíduo.


“É possível fazer a escritura de autocuratela sem qualquer diagnóstico, mas no início de diagnóstico de doenças incapacitantes, como Alzheimer, é ainda mais importante.”


A professora enfatiza que o Provimento 206/2025 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelece que, ao processar uma interdição, os juízes de Direito deverão consultar a Central Notarial de Serviços Compartilhados. Essa consulta visa verificar a existência de escrituras de autocuratela ou diretivas de curatela, cujo resultado deve ser anexado aos autos do processo, garantindo que a vontade prévia do indivíduo seja considerada.

 

Ainda segundo a diretora da OAB/RJ, o testamento vital, também denominado diretivas antecipadas de vontade, constitui uma escritura pública onde a pessoa registra quais tratamentos médicos deseja ou não receber caso se encontre em fase terminal ou incapaz de expressar sua vontade. Esse instrumento permite, por exemplo, determinar que não se deseja submeter a tratamentos artificiais para prolongamento da vida que causem sofrimento, ou recusar uma transfusão de sangue em caso de acidente ou cirurgia, demonstrando a relevância da participação da equipe médica na identificação dos tratamentos e na disposição sobre eles.


“Por esse documento é possível determinar que a pessoa não deseja se submeter a tratamento para prolongamento da vida de modo artificial, às custas de sofrimento, ou ainda, deixar claro que se recusa a receber transfusão de sangue em caso de acidente ou cirurgia.”


Rose esclarece que o testamento vital não é um testamento no sentido tradicional, pois seus efeitos se produzem ainda em vida, no momento em que a pessoa não pode mais participar ativamente das decisões de saúde devido ao avanço de uma doença. As diretivas antecipadas de vontade também podem ser consultadas na Central Notarial de Serviços Compartilhados (Censec), proporcionando maior segurança jurídica e respeito às escolhas individuais. Além desses documentos, existem as procurações de saúde, onde um indivíduo nomeia um procurador, que pode ser um familiar ou médico, para tomar decisões sobre sua saúde, sendo comum que essa procuração de saúde seja combinada com uma procuração de plenos poderes.

 

Planejamento para o Envelhecimento e Proteção Patrimonial

Para Rose, os atos de planejamento do envelhecimento são cruciais para assegurar maior dignidade no fim da vida, permitindo que as escolhas sobre cuidados, como local de moradia e contratação de cuidadores, sejam as mais adequadas à própria vontade do indivíduo. Sob essa perspectiva, tais instrumentos também se configuram como uma defesa contra a violência patrimonial, uma vez que garantem que o uso dos bens seja direcionado integralmente para o bem-estar e as necessidades da pessoa.

 

O planejamento sucessório, por sua vez, visa à organização patrimonial para o período após a morte do indivíduo. Os principais instrumentos utilizados são o testamento, os seguros de vida, as doações de bens em vida e o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), uma modalidade de plano de previdência privada. No testamento, seja ele particular ou público, é importante lembrar que 50% dos bens são destinados aos herdeiros necessários, como ascendentes, descendentes ou cônjuges, enquanto os outros 50% podem ser direcionados a outras pessoas ou instituições, como de caridade, religiosas ou de ensino.

 

No estado do Rio de Janeiro, o custo do testamento público é calculado com base no valor declarado dos bens, o que muitas vezes o torna inviável, levando o testador a optar pelo testamento particular. O seguro de vida, por sua vez, é uma ferramenta estratégica que oferece liquidez aos herdeiros, facilitando a cobertura de despesas do inventário, como impostos, custas cartoriais e honorários advocatícios, além de outras despesas imediatas que não podem aguardar a finalização do processo. Outros recursos importantes incluem o VGBL, que, por ser considerado um seguro, não é incluído no inventário, e a doação de bens em vida com usufruto, como no caso de um imóvel.

 

Edyanne Moura da Frota Cordeiro, presidente do Colégio Notarial do Brasil – seção Rio de Janeiro (CNB/RJ), aconselha que pessoas com histórico familiar de doenças neurológicas e degenerativas, ou aquelas que possuem um patrimônio significativo, devem considerar a utilização desses instrumentos para se protegerem no futuro. Ela destaca que mesmo indivíduos que praticam esportes de alto risco, passíveis de acidentes com sequelas, podem se beneficiar dessas ferramentas, que abrangem um público bastante amplo.


“Outro exemplo é o de uma pessoa que pratica esportes de alto risco, que pode sofrer um acidente e ficar com alguma sequela. Esses atos cartoriais contemplam um público muito extenso.”


Para Edyanne, os benefícios desses atos notariais incluem a garantia de tranquilidade para o futuro e a possibilidade de evitar que parentes indesejados administrem bens e questões de saúde, o que é especialmente relevante para pessoas que não possuem filhos ou netos. Ela ressalta que, caso um indivíduo não tenha parentes até o quarto grau, seus bens serão destinados ao município do Rio de Janeiro, evidenciando a importância do testamento como manifestação da última vontade.

 

Em uma iniciativa de abrangência nacional, cartórios em diversas capitais e cidades do país realizaram, no último dia 29 de dezembro de 2025, a Jornada Notarial 2025 – Proteger o Futuro é Planejar o Presente. Esta ação de cidadania, promovida pelo Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF) e suas seccionais estaduais, teve como foco a proteção de pessoas idosas e a conscientização sobre a importância do planejamento pessoal e patrimonial, oferecendo orientação jurídica gratuita ao público em locais de grande acesso.

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